A casca dourada e inútil das horas

 


Quem mata o tempo não é um assassino, é um suicida.

Millôr Fernandes

Opa. Teria um minuto? Coisa rápida, terráqueo, garanto. Não se preocupe, pois o assunto do telecurso de hoje é breve e pertinente, velho conhecido nosso, figura tarimbada em música e poema... (numa empostação ligeiramente bufferiana) “it’s Time”!

Está rindo, cara pálida? Seria cômico se não fosse trágico. Vê bem, parece até “vale-tudo" mesmo. Não temos tempo para mais nada. Sempre ocupados com nossos afazeres e desfazeres, o dia parece curto para tantos compromissos e quando, por fim, surge uma nesga de horas, a jogamos deliberadamente no ralo, com coisas fúteis e sem importância, em nosso octógono diário. Non è vero? È vero.

Agora, pare tudo e responda rápido: por que o tempo que passamos na cadeira do dentista ou numa fila qualquer parece mais demorado do que aquele usufruído em momentos de diversão e lazer, com as pessoas que nos são queridas? Ahn? É, no mínimo, estranho, não acha? O segredo, apressadíssimo leitor, está na importância que damos aos ponteiros, à areia que desce na ampulheta. E convenhamos, nossa relação com eles é um caso de amor e ódio, quando não briga das feias.

Por conta desse nosso relacionamento tão conturbado com o tempo, a ansiedade tornou-se uma companheira diária. Mas se ele é criação do homem, como pode nos subjugar dessa forma? Millôr Fernandes nos alerta sobre isso. Se matando o tempo, escolhendo ou não o que fazer com ele, matamos a nós mesmos, envenenamo-nos pouco a pouco, dia após dia.

É claro e evidente que temos uma ideia um tanto deturpada sobre o tempo e as atividades que podemos cumprir (a expectativa é sempre maior), mas alguns de nós busca de maneira consciente uma rotina de multitarefas como fuga da realidade, o que é um problema ainda mais grave.

 

O que é realmente importante para você? Na verdade, tudo é uma questão de prioridade, e, sobre isso, também refletiu Mário Quintana: Se me fosse dado um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio. Seguiria sempre em frente e iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas…”.

Viu? Foi rápido e nem doeu.

Que tal trocarmos aqueles minutos zapeando a TV ou deslizando o dedo no celular por uma conversa atenta com os filhos e esposa, balançar na rede, ler um livro, cuidar do jardim? Às vezes, o eterno dura apenas um segundo. Faça valer a pena.

George dos Santos Pacheco

georgespacheco@outlook.com

* Publicado originalmente no Portal Multiplix, em 08 de março de 2023. Foto: Dhiógenes Hendrix

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