Verde e amarelo. Por onde se move o olhar, é apenas verde e amarelo
que se vê. Não, não é uma espécie de daltonismo, esse é o efeito Copa do
Mundo – a segunda no país e em ano de eleições presidenciais. O
comércio aproveitou a data e tingiu tudo o que pode e o que não pode das
cores do pavilhão nacional: camisas, bandeiras, toalhas, cuecas, panos
de prato, tudo, tudo é verde e amarelo. É sufocante. Até outdoor está
pintado assim para chamar a atenção, mesmo que a mensagem não tenha nada
a ver com futebol.
Verde e amarelo. Parece até música do carnívoro Roberto Carlos.
De quatro em quatro anos, mais de 90 milhões entram em ação para torcer
pela seleção brasileira de futebol, entusiasticamente, numa espécie de
patriotismo sazonal que acomete homens, mulheres e crianças, e que
movimenta o comércio com seus subprodutos de gosto duvidoso. É bonito
ver essa gente patriota abraçada à bandeira nacional, símbolo máximo de
uma nação, vibrando e se emocionando nos estádios e em frente à TV.
Posição de sentido, mão no peito e lágrima no olhar: “Pátria amada,
Brasil!”, o povo aprende a cantar até o hino nacional, tantas vezes
criticado pela linguagem rebuscada e o preciosismo vocabular. Um
patriotismo um tanto deturpado, concorda comigo?
Seria bom que tanta energia patriótica estivesse voltada
realmente na direção da Pátria. Segundo o dicionário, Patriotismo é o
“Amor à pátria”, e tem como sinônimo o Civismo, “Dedicação à pátria;
devoção ao interesse público; patriotismo”. Então patriotismo nada tem a
ver com futebol, apesar de o conceito estar sendo incutido há anos no
imaginário do brasileiro.
Devoção ao interesse público.
Mas se no esporte o Brasil vem emocionando, no campo do interesse
público, ele não anda muito bem das pernas. Estamos totalmente
desentrosados, nossos jogadores estão pendurados no cartão, jogando
contundidos e na retranca. Hospitais lotados, mal conservados, escolas
sucateadas, ausência de professores, e enquanto isso estádios
superfaturados estão sendo construídos, e as cidades preparam-se para
“inglês ver”, literalmente falando. Jogo feio de se ver, ofuscado por
essa cortina de fumaça, assim como é o carnaval e os reality shows, que
desviam o foco de atenção do que é verdadeiramente importante.
Pessimista, eu? Olhe em sua volta. Você por acaso daria uma festa
em sua casa para os “amigos” se tudo estivesse errado? Se faltasse
comida para um de seus filhos, assistência médica ou segurança? Acho
pouco provável.
Mas “um filho teu não foge à luta”. Há bem pouco tempo atrás, um
povo heroico vestiu a camisa por serviços públicos de qualidade e entrou
em campo anunciando em brados retumbantes que o “gigante” havia
acordado. Entretanto, “forças ocultas” rapidamente desvincularam o ato
de seu patriotismo, estigmatizando-o como baderna e quebra-quebra. Nem
se fala mais no assunto.
E assim, mais uma vez se manteve o status quo: governantes que
dominam, povo dócil que se deixa manipular. Não faça essa cara, esse é o
retrato do Brasil, salvo raras exceções. Mas a mudança ainda é
possível. Patriotismo não é se envolver na bandeira nacional e torcer
por mais um gol, nem mesmo votar nas eleições. O conceito de patriotismo
está vinculado diretamente ao conceito de cidadania, e isso é muito
mais que escolher representantes, é participar ativamente da vida
política, escolhendo, cobrando, decidindo e mais do que isso, fazendo.
Em sua casa, em seu bairro, em sua cidade.
Por isso, vista a camisa, desligue a TV e levante do sofá, não
permaneça deitado em berço esplêndido. Saia do discurso e parta para a
ação, vamos todos juntos, conquistar com braço forte o penhor dessa
igualdade.
George dos Santos Pacheco
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