A moça da casa ao lado



- Você me ama? - perguntou Luísa, deitada de lado, coberta apenas por um fino lençol branco. Seu rosto não tinha nada demais, contudo, seu corpo era um espetáculo a parte. Era coberto por pequenos pêlos dourados, sua pele era morena e levemente macia. Seus cabelos eram longos, encaracolados, e sedosos. Brilhantes tal qual seus olhos verdes. Fitava seu marido intensamente e ansiava pela resposta como se fosse a primeira vez que a ouviria.

- Mas é claro que sim! - respondeu Romeo, com o sorriso safado que sua mulher tanto gostava. Ao contrário dela, estava descoberto, pois sentia calor com facilidade. O quarto estava sendo invadido pelos primeiros raios de sol e os pássaros cantarolavam um após o outro suas canções, e isso lhes era agradável. Porém, a resposta de Romeo provocou algo em Luísa que não o esperado. - Porque está me perguntando isso?

- Ora, por que gosto de perguntar... - disse ela desviando o olhar. - Você nunca me pergunta isso... - afirmou melancolicamente.

- Não pergunto porque tenho certeza disso. Você tem alguma dúvida? - disse ele coçando os cabelos curtos e crespos. Luísa sempre reclamava desse jeito dele se coçar. Dizia que ao fazer isso parecia-se com um tarado.

- Não, não tenho dúvidas... - disse ela se levantando lentamente e caminhando em direção ao banheiro. Romeo ficou observando o jeito elegante da esposa caminhar, repa-rando em cada detalhe de seu belo corpo. O olhar libidinoso o transportou novamente a poucas horas atrás. Lembrava-se da textura da pele da mulher, de seu cheiro... Havia sido uma ótima noite. - Por que pergunta então? - disse ele, arrependendo-se imediatamente. Pensou que teria sido melhor não ter insistido no assunto. As mulheres são máquinas dife-rentes do homem e em algumas situações, suas reações são imprevisíveis. Ele havia perdido uma excelente chance de ficar calado. Levantou-se, espreguiçou-se e foi atrás da mulher. Talvez houvesse uma oportunidade de reverter a situação.

- Eu gosto de ouvir você dizer que me ama. Me sinto mais amada. Às vezes acho que você não me ama completamente. É... sei lá, estranho... - disse ela seriamente enquanto secava o rosto. Romeo se aproximou.

- Pensei que você se sentisse amada o tempo todo. Eu não preciso ficar ouvindo que me ama para me sentir assim. Mas se você quer...

 - disse ele abraçando-a com aquele sorriso safado - Eu te amo, eu te amo, eu te amo... - disse beijando todo seu rosto até chegar em sua boca. Segurou fortemente seus glúteos, puxando-a para si, sentindo-a ficar ofegante em pouco tempo.

- Ah, pára! - disse ela sorrindo. Romeo havia conseguido. Afastara aquela nuvem negra que pairava sobre seu amor, posto à prova recentemente. Enquanto a beijava, pensava sobre tudo que ela lhe disse. Mas será que tinha razão? Não estava conseguindo expressar seu amor? Pelo sim e pelo não, tomou uma decisão. De agora em diante iria procurar todas as formas para fazer sua esposa mais feliz, e se sentir tão amada quanto ele. Beijaram-se e amaram-se mais uma vez e a manhã foi tão boa quanto a noite. Luísa estava deitada novamente e com um lindo sorriso, mais tranquila que outrora.

- Eu volto já! - disse ele ao beijá-la e levantou-se.

- Onde você vai? - perguntou ela apoiando-se nos cotovelos.

- Fique aí, poxa! Eu já volto! - disse outra vez e saiu pela porta.

Retornou minutos depois, trazendo uma bandeja nas mãos, com um inesperado café da manhã. Isso era um novo começo.

O dia passou tranquilamente, como em qualquer fim de semana. Os sinos da igreja tocaram, os cachorros latiam nas ruas, e as crianças quebravam uma vidraça ou outra en-quanto jogavam bola, com gols improvisados com sandálias de borracha branca encardida e tiras azuis. Romeo assistiu a programas esportivos na tv, como gostava, e Luísa lia um pouco de um livro. Não conseguia parar enquanto não chegasse ao final. Romeo levantou-se do sofá ao ouvir um barulho e se aproximou da janela. Um caminhão acabava de chegar, junto com um carro de passeio.

- O que está acontecendo querido? - disse Luísa. Isso é uma das coisas que a má-quina mulher tem de diferente. Mesmo absorta em sua leitura, conseguiu perceber os sons que vinham de fora e o marido que se levantava. Se fosse Romeo, isso provavelmente não teria ocorrido.

- Acho que estão se mudando para a casa ao lado... - disse ele, parando justamente na hora em uma moça descia do carro. Usava um fino vestido azul claro, talvez fosse vis-cose. Sua pele era branquíssima e seus cabelos ruivos, tão finos que uma simples brisa bagunçava-os. Estava a certa distância, e mesmo que Romeo insistisse, não conseguia identificar a cor de seus olhos. Parecia jovem, e seu corpo era esguio, porém, com curvas bem definidas. Pôs a mão na cabeça, como se lamentasse algo e voltou ao carro para pegar alguma coisa. Abaixou-se à beira da janela, debruçando-se, e seu vestido subiu colado às suas coxas, pouco, mas suficiente para que Romeo percebesse que a moça não usava nada por baixo daqueles finos panos azuis. Sentiu um frio na barriga... Era impossível não ob-servar aquela cena, tão... sensual. Ele era homem poxa! A moça pegou o que queria e ele nem percebeu que ela o avistara. Estava como que hipnotizado. A moça acenara para ele, sorrindo e ele havia ficado tetanizado novamente, sentindo aquele frio na barriga, tanto que não percebia nada que acontecia à sua volta. Inclusive que sua esposa estava ao seu lado.

- Vamos lá dar as boas vindas a eles! - disse ela amigavelmente. Romeo suspirou aliviado. Isso era sinal de que ela não tinha visto mesmo que ele.

- Não querida, em outra ocasião eu dou as boas vindas. Mas se você quiser pode ir até lá... - disse ele beijando-a e voltando ao sofá, com certo desdém, mas não podia negar que a moça lhe impressionara.

O homem que se mudara com a família era militar e gostava pouco de conversas, e isso foi fácil de descobrir nos dias que se seguiram. Sua esposa fazia parte de alguma agremiação, e praticamente não ficava em casa. Os dois retornavam à tardinha. A moça que Romeo viu era a filha do casal. Julinha, como ele mesmo a ouviu ser chamada. Não conseguia esquecer nada que se relacionasse com ela, muito menos aquele ótimo descuido com o vestido, no dia em que chegou. 

Romeo voltava do trabalho por volta das três da tarde. Era representante de vendas, e não tinha um horário definido. Já Luísa, que era professora, e dava expediente em mais de uma escola, chegava bem mais tarde. Por conta dessa correria do dia a dia, e a situação financeira - que não era das mais invejáveis - ainda não tinham filhos, mas eram felizes. 

Na maioria das vezes, Romeo encontrava Julinha molhando as plantas do jardim, usando roupas curtas, transparentes, ou exageradamente folgadas. Seu sorriso era intrigan-te, enigmático, e seus olhos, os quais ele tanto ansiou por ver, eram castanhos, lascivos, e cintilavam a todo o momento, parecendo convidar a alguma travessura. Sentia-se inibido ao cruzar com aqueles olhos, e sempre desviava o olhar. Ela sempre fora muito simpática, cumprimentando-o todas as vezes que o via. Certa ocasião, algo inesperado aconteceu.

- Hei moço! - chamou Julinha, ao ver Romeo se aproximar de casa, à tarde.

- Pois não? Algum problema? - disse ele, demonstrando certa tensão.

- Estou com um probleminha aqui, e preciso de sua ajuda... - disse ela abrindo um pouco a porta.  Vestia um roupão vermelho rubi, amarrado na cintura, que Romeo imaginou ser de sua mãe. Ela devia ter por volta de seus dezenove anos e o que vestia não parecia em nada com seu perfil, apesar de ele já ter percebido que ela gostava de chamar a atenção.

- Com licença... - disse ele ao abrir o portão, evitando olhar para os lados. Sua im-pressão era que estava sendo observado por todos, e qualquer movimento estranho denota-ria que algo estranho estava acontecendo. Estava? Ele acreditava, ou preferia acreditar que não.

A casa era bem decorada, apesar de simples. Também era muito limpa e organizada, enfim, o que se esperava da casa de um militar. Em uma das paredes da sala estavam vários pratos com gravuras representativas de diversos países. O homem era bastante viajado...

- Desculpe incomodar Romeo... Seu nome é Romeo, não é? - perguntou ela ao corar levemente.

- É sim. - respondeu ele secamente.

- É que fui tomar banho e, não sei, acho que meu pai fechou o registro para conser-tar um cano e esqueceu-se de abrir. Eu não consigo...

- Onde é o registro? - perguntou ele acompanhando a moça, e observando seu jeito de rebolar enquanto caminhava. Mentalmente, justificava-se que era homem, e esse tipo de atitude era perfeitamente compreensível.

- É aqui no banheiro. - disse ela ao entrar. Romeo deixou sua maleta no chão e foi direto na válvula, que não estava muito presa. Se ela tivesse insistido mais um pouco teria conseguido.

- Está pronto! - disse ele com um simples sorriso.

- Mas você é muito forte... - disse ela com a voz melodiosa, se aproximando dele e tocando em seus braços. Sua camisa estava levemente suada, graças a caminhada que tinha feito do centro da cidade até sua casa.

- O que é isso garota? - disse ele sem se esquivar.

- Ora não me chame de garota. Você já sabe meu nome. Também não finja que não me quer. Bem sei que me observa desde o dia em que cheguei... - disse ela abraçando-o com força, beijando-lhe o pescoço e mordiscando sua orelha.

- Mas então... aquilo foi de propósito?! - perguntou ele perturbado. A situação já o estava fazendo suar frio.

- Mas é claro que foi! Eu percebi que você estava me olhando, então fiz questão que visse algo a mais... - disse ela ao beijar-lhe a boca. - Normalmente eu não uso nada por baixo, sabe? Recomendação médica...

- Não! Pare com isso já! Não podemos! Eu... eu... amo minha esposa! - disse com dificuldade ao afastá-la, tentando falar o mais baixo que podia.

- Mas pode continuar amando-a. Eu não quero exclusividade. Serei apenas sua di-versão... Venha! Vamos tomar um banho juntos... - disse ela deixando cair o roupão. Ele não estava errado no que imaginara. Apesar de esguio, era incrivelmente bonito. Havia um caminho de finos pêlos que desciam pelo umbigo da mulher. Os olhos de Romeo saltavam às órbitas e ele não sabia o que fazer.

- Já sei... Prefere que eu dance antes? Gosta de preliminares? É só pedir. Você manda e eu faço, ok? - disse ela entrando no box de vidros transparentes e ligando o chu-veiro. A água forte caiu em seus finos cabelos que logo estavam colados à cabeça e o pes-coço, e ele não pôde negar que ela ficara mais bonita ainda desse jeito. Começou a passar as mãos em seu corpo, colando-o vez em quando ao vidro.

- Não... não podemos... - disse ele saindo apressadamente, limpando o rosto mo-lhado. Em nenhum momento pensou que essa garota fosse capaz disso.
- Eu não vou desistir de você docinho... - disse Júlia no banho, desenhando um co-ração grotesco no vidro suado.

Romeo entrou em casa ofegante, aliviado por já estar ali. Jogou sua maleta no sofá e subiu até seu quarto. Precisava urgentemente de um banho gelado, a fim de acalmar seus instintos que convulsionavam lá dentro. Ficou pensando em como essa mulher era louca e... linda. Sim, ela o atraía, e muito. Mas ele amava Luísa e não podia fazer isso. Ela não merecia. Foi se secar próximo à janela e olhou para a casa do lado. De lá era possível avistar o quarto da moça e ela sabia disso. A safada estava lá, sorrindo e pondo as mesmas roupas provocantes que ele já conhecia.

Acalmou-se e foi preparar o melhor jantar que podia para sua esposa. Já havia mo-rado sozinho e cozinhava como ninguém. Lombinho de porco grelhado e batatas sauté. Para acompanhar, um excelente vinho branco. Luísa chegou em casa deparando-se imedia-tamente com o cheiro maravilhoso do jantar, o que para alguém que chega cansado do  trabalho é um espetáculo à parte. Percebeu, porém, que o marido estava diferente, mas não soube identificar o que era. Talvez fossem os negócios que não iam bem.

- Hum... Mas que delícia, hein? - disse ela se aproximando e beijando-o.

- Olá querida! O jantar está quase pronto... - disse ele um pouco distante.

- Aconteceu alguma coisa? Você está... estranho. - disse ela franzindo o cenho.

- Nada demais. Digamos que meu dia foi... fastigante. - Na verdade, surpreendente, pensava ele ao falar.

- Então tudo bem! Prometo não demorar no banho... - disse ela ao beijar novamente e subindo as escadas correndo em seguida.

- Eu te amo! - disse ele sem desgrudar os olhos das panelas ao fogo.

- Também te amo querido! - gritou ela do alto das escadas.

A partir desse dia evitou olhar para a casa ao lado. Sabia que tinha uma queda por Júlia, e precisava afastar-se dela a todo custo. "Afastai-vos de toda a aparência do mal." , ouviu o padre dizer certa vez. Será que era sobre isso que ele estava falando? E se o mal não se afastasse de nós? Ele achou que ela fosse desistir, mas não foi o que aconteceu. Pensou que era apenas fogo de palha, e que em pouco tempo ela nem se importasse mais com ele. 

Romeo começou então a encontrar cartas por baixo da porta, e temia que Luísa as encontrasse antes. Isso seria o fim! A garota dizia que o desejava cada vez mais e que faria tudo para ficar com ele. A última carta o fez voltar àquela casa. Já não sentia tesão, mas raiva de Júlia. A garota parecia obstinada a acabar com seu casamento, e era isso que ela ia fazer se ele não pusesse um ponto final nessa história, o mais rápido possível.

- Abra a porta... - disse ele batendo com força.

- Fique à vontade... - disse ela ao abrir, franqueando a passagem para ele. - Eu sempre soube que voltaria...

- Preste bem atenção, pois só vou falar uma vez... - disse apontando o dedo em ris-te. - Sou casado e amo minha esposa, e nada que faça poderá mudar isso. Você entendeu bem? 

- Não entendo o porquê de sua raiva. Você pode continuar com sua esposa, até porque eu nunca quis tomar o lugar dela... Mas estou ficando convencida que o problema sou eu. Não sou atraente? Não acha que posso te fazer feliz?
- Veja, o problema não é esse. Você é linda e com certeza encontrará alguém que lhe ame e lhe faça feliz...

- Lembra-se desse vestido? Eu o usava no dia em que cheguei. Também não estou usando nada embaixo hoje... - sussurrou ela ao se aproximar dele.

- Pare já com isso! - esbravejou ele, sacudindo-a pelos ombros, e soltando-a logo em seguida, indo Júlia cair ao chão. - Não insista, ou vai sofrer mais... - disse Romeo, voltando ao seu tom de voz normal. Suas mãos tremiam enquanto enxugavam o suor de seu rosto.

- E o que vai fazer? Me bater? - disse ela dando uma gargalhada, ao se levantar. O vestido de pano leve havia levantado, mostrando grande parte de seu corpo branco e es-guio, tornando ainda mais difícil a tarefa de Romeo.

- Não insista Júlia... Não podemos... - sussurrou dando-lhe as costas. As lágrimas surgiam de seus olhos, mas não rolavam pela face.

- Eu entendi. Você fez sua escolha... - disse ela limpando seus olhos e se afastando dele. - Mas não vá ainda. Tenho algo a lhe dar, como um presente. - disse ela indo em di-reção da estante, fungando o nariz. Ele permanecia de costas e não viu quando ela desem-brulhou um revólver de uma flanela, tirando-o de uma gaveta e puxando o cão ao apontar para ele. - Não vai querer seu presente? Espero que goste...

- Cuidado com isso menina... Isso pode machucar alguém! - disse ele ao se virar e ficar frente a frente a uma moça trêmula e descompassada.

- Cale a boca! Você já falou o bastante. Agora apenas eu falo. – disse ela tremendo as mãos ao empunhar a arma calibre 32, cromada que reluzia com os fachos de luz que ultrapassavam as cortinas de renda. - Eu só queria te dar prazer como nunca teve na vida. - disse limpando o nariz com as costas de uma das mãos. - Mas você preferiu aquela vadia sem sangue, completamente insossa. E eu ainda te dei a oportunidade de ter nós duas, mas não, você quis apenas ela...

- Cuidado com isso... - gaguejou ele.

- Eu jamais fui recusada, por nenhum homem ou mulher. Você sabe o quanto isto é humilhante?

- Abaixe essa arma, por favor! - insistiu ele, tentando recuar.

- Já mandei você calar a boca! Agora levante os braços e não os tire daí. - disse ela se aproximando e encostando seu corpo magro ao dele. Colou a boca do cano em sua bar-riga e beijou-lhe os lábios. - Agora, diga que me ama. No ouvido. quero me sentir amada por você...

- E... eu te a... amo...

- Ainda não me convenceu. Diga: Eu te amo Julinha...

- Eu te amo Julinha... - sussurrou ele.

- Viu? Isso não podia ter sido diferente? Eu te dei todas as chances e você desper-diçou uma a u... - disse ela sendo interrompida por um beijo de Romeo. Por uma momento pensou que o tinha convencido, e que ele havia se entregado a paixão violenta e despudo-rada. Mas percebeu tratar-se de um embuste. Foi a única coisa em que ele pensou para distraí-la, e assim desvencilhar-se da teia em que ela o tinha envolvido. O problema é que a presa nunca percebe que quanto mais se agita, mais presa fica...

Romeo segurou fortemente no pulso da mão que segurava o revólver enquanto ela se debatia, tentando livrar-se de seus braços, ainda sorvendo o sabor da luxúria em sua boca. Os dois caíram ao chão, sendo ouvido logo em seguida o estalido seco característico da pólvora incendiada na cápsula da munição do revólver. Os dois separaram-se imedia-tamente, entre gemidos, e a moça chorava desesperada, ainda com a arma nas mãos ensan-guentadas, assim como seu belo vestido azul. Romeo segurava a barriga que vertia sangue com força e pulou em cima da mulher. Seus olhos transbordavam raiva, como os rios em março.

- Desgraçada! - disse ele segurando fortemente na garganta da mulher que lenta-mente sufocava. Ela fez mais dois disparos, antes de deixar a arma cair. Seus braços pen-diam sem força, e ela tentava sugar o pouco ar que lhe restava. As mãos de Romeo, porém, foram ficando cada vez mais fracas, até que soltaram por completo o pescoço de Júlia. Sua cabeça ficou pousada entre seus seios, ainda com o olhar apavorante, misto de ódio e dor. Um olhar que via a morte se aproximar. Fazia um barulho estranho e ela imaginou ser o ar ao passar pela garganta, expulso de seus pulmões agora inertes. A vida esvaía com o sangue que formava uma grande poça vermelho escuro, na qual Júlia estava deitada, gemendo e chorando.

A ajuda veio em seguida, atraída pelo som dos tiros. Ela alegou legítima defesa, o que foi constatado e aceito pela polícia ao averiguar a cena do crime e o cadáver que tinha resto de pele da vítima sob as unhas. Júlia disse que desde que chegara ali com seus pais o vizinho a assediava e que nesse dia, aproveitara que ela estava sozinha em casa para tentar estuprá-la. Algumas testemunhas confirmaram que o homem já tinha entrado naquela casa, em um horário em que ela estava sozinha. As autoridades aceitaram o depoimento da moça e das testemunhas, e arquivaram o caso. Um mês depois sua família mudou-se daquela casa.

Romeo, não conseguiu provar para sua esposa o quanto a amava. Ela acreditou em tudo que viu e ouviu, e entendeu que o ótimo e repentino comportamento do marido não passava de um estratagema para esconder sua paixão por Júlia. Lembrou-se de seu olhar sacana de que tanto gostava e de seu jeito tarado de coçar a cabeça. Não suportou as recordações e também se mudou, desejando nunca ter conhecido Romeo, e amaldiçoando o dia em que isso aconteceu.

As mulheres, são máquinas completamente diferentes do homem, e em todas as situações, sem exceção, suas reações são imprevisíveis.

George dos Santos Pacheco

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